Evidencia que as mulheres negras brasileiras ainda são ignoradas nas representações midiáticas.

Evidencia que as mulheres negras brasileiras ainda são ignoradas nas representações midiáticas.

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As reflexões tecidas nesta pesquisa investiram esforços em evidenciar e compreender a representação das mulheres negras na mídia em uma sociedade periférica multirracial. Compreender o papel da mulher negra na mídia, mais especificamente nas publicações de gênero feminino, implica entender sua enunciação na sociedade civil. Acredita-se que o lugar em que as mulheres negras se forjaram e foram forjadas na mídia vai além do de subalterna, protagonista do sexismo e do racismo.

Este estudo evidencia que as mulheres negras brasileiras ainda são ignoradas nas representações midiáticas. Mesmo teoricamente sendo parte do recorte de gênero atendido pela revista “Nova Cosmopolitan”, a negra não é representada e nem está incluída como possível leitora nas pautas executadas pela Nova Cosmopolitan, assim como as mulheres de etnia branca.

Tanto no plano de mídia como na linha editorial da revista, percebe-se que a variável “raça” não aparece como uma preocupação ou demanda da esfera da produção. O principal referencial parece ser as pesquisas de mercado, mas o perfil da leitora não menciona dados por raça e, sim, por faixa etária, gênero e classe social. Mesmo não sendo possível contabilizar o número de leitoras negras desta publicação específica, é inegável que a revista conceba que, entre suas leitoras, haja negras.

Quando mulheres negras aparecem no conteúdo das reportagens, por exemplo, essas, na maioria das vezes, são representadas por celebridades (como no caso mais explícito da atriz Taís Araújo) que testemunham as vantagens de se conquistar a “fama e o sucesso” na sociedade brasileira. Parece não haver uma preocupação específica no enfoque das relações raciais e as temáticas que envolvem essa questão. As reportagens abordam mais o papel da mulher, seu lugar social e as representações de gênero que recaem sobre ela.

Na propaganda, elas aparecem geralmente para agregar universalidade ao produto, reforçar o “politicamente correto” e o mito da democracia racial. As modelos negras são utilizadas também para reforçar a imagem de uma marca já consolidada, que coloca no mercado extensão de produtos voltados para a etnia negra segmentando o produto às mulheres de cabelos crespos, exemplo disso são as peças publicitarias da Loreal que tem como garota propaganda a Ildi Silva e a Taís Araújo.   Já no editorial a mulher negra é representada, para ressaltar um estilo considerado por especialistas da moda como inadequado (como na coluna Over X Sexy), ou para associar sua imagem de beleza e sucesso a um produto como é o caso da seção Roube o look.

Embora seja possível dizer que a revista em questão não tem a “raça” como temática, bem como são raras as revistas que a tem (como a Raça Brasil), de modo geral, a mulher negra aparece de forma não circunscrita e em situações específicas.  Na maioria delas por sua fama ou beleza (atrizes, modelos ou cantoras). Neste caso, pode-se dizer que a variável raça, quando raramente aparece, se dá por meio de estereótipos esta respaldada pela análise quantitativa exposta no quadro na página 30.

Essas constatações remetem às formas ambíguas de discriminação no país. A opressão midiática a que se submetem as mulheres negras pode ser compreendida como uma articulação entre sexismo e o mito da democracia racial propagado. A noção da teoria do branqueamento e da invisibilidade do negro na sociedade brasileira favorece o posicionamento no qual a mulher negra está compelida na mídia de um modo à dominação racial e de outro à machista.

Nesse sentido, pode-se dizer também que o binômio “maioria-minoria” parece prevalecer com força na sociedade brasileira. Maioria e minoria aqui entendidas não em termos numéricos, mas, sim, nas relações de poder. Ou seja, embora os dados do IBGE digam o contrário, os negros ainda são vistos como minoria no país. No caso das mulheres negras, então, a situação se agrava ainda mais, como já apontado pela revisão teórica nos primeiros capítulos desta pesquisa. Com isso, elas continuam desvalorizadas e não inseridas na cultura dita da maioria, num processo continuo de exclusão e discriminação.

Os discursos da revista, tanto imagéticos quanto verbais (ou pela ausência de ambos) revelam que tratar as questões que envolvem a temática da mulher negra ainda é um desafio para publicações femininas. As mulheres negras, como já pontuadas, são apresentadas e representadas por meio de aparições pontuais e deslocadas do restante da publicação, como se estivesse ali para cumprir cotas, revelando, de certa forma, um desconforto dos editores e dos jornalistas para tratar do assunto.

No geral, o público-alvo focado pela Nova Cosmopolitam é a mulher branca, sendo a branquitude retratada como normativa. A revista produz um discurso que carrega todas as ambiguidades do racismo brasileiro (afirmação por meio da própria negação) e do mito da democracia racial. A revista Nova não representa a mulher negra em suas pautas em um status de inferioridade apenas, mas sim de invisibilidade. 

A dificuldade de representar a mulher negra torna-se tão evidente que, mesmo diante de uma modelo internacional que se autodeclara e é popularmente conhecida como negra (Naomi Campbell), a revista a caracteriza como morena. Por outro lado, embora possa parecer contraditório, na publicidade, percebe-se um diálogo direto da raça com a “beleza”, com a “moda”, com a “saúde”. A imagem da mulher negra é utilizada de forma constante como garota propaganda explicitando, de certa forma, que ela está inserida como público-alvo da revista para o setor publicitário, passando uma ideia de uma mulher negra apta a adquirir a revista e produtos nela anunciado.

A pesquisa conclui, desta forma, que o conteúdo acerca da mulher negra na revista Nova Cosmopolitana é ambíguo e insidioso, assim como o são as relações raciais em nossa sociedade E as pautas executadas pela publicação parecem apenas integrar o marketing social da revista para preservar a imagem do politicamente correto ou para atender uma demanda por parte das leitoras, como é o caso da edição de janeiro de 2011 (que integra a análise quantitativa deste estudo). Neste caso, embora a edição não integre o recorte da análise qualitativa, vale ser ressaltado e usado como exemplo por sua relevância e peculiaridade. Nesta edição é utilizada a foto da modelo internacional Noami Campbel para ilustrar um passo a passo de como fazer uma maquiagem, em seu discurso a revista se posiciona e deixa claro que só o faz para atender os anseios das leitoras “Atendendo a pedidos, vou dar uma aula especial só para Negras.” Essa frase demonstra que sim, a revista tem leitoras negras que fazem questão de matérias voltadas para suas características étnicos raciais, mas a revista só as fazem e as reconhecem como público alvo quando há uma pré demanda explicita para ofertar a matéria.
A invisibilidade da mulher negra é constatada em todas as edições analisadas. Mesmo quando ocupa um espaço imagético de destaque não é mensurada em suas chamadas e textos a sua etnia como critério de agregação de valores como é comumente utilizado para caracterizar as loiras, por exemplo. A posição que a mulher negra ocupa nas matérias e na publicidade são distintas, mas igualmente perversas. 


Etiene Pereira Martins-
Graduada nos cursos jornalismo e Publicidade Propaganda.
Colaboradora da Revista Raça Brasil desde maio de 2010

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