TERÇA-FEIRA, 26 DE FEVEREIRO DE 2013
GUEST POST: CADÊ AS NEGRAS NAS REVISTAS ADOLESCENTES?
Já faz um tempo, recebi de uma leitora um belo livro sobre como as revistas adolescentes no Brasil veem e retratam a mulher negra. Usei um dos capítulos num curso de extensão sobre análise dos preconceitos na mídia, e foi muito produtivo.
Hoje quero publicar um post dessa autora falando um pouquinho desse seu projeto. Carolina dos Santos de Oliveira é historiadora, mestre em educação, participante do grupo de ações afirmativas na UFMG, e desde 2007 trabalha com a implementação da lei 10.639/03, que trata do ensino de história da África e cultura afro-brasileira. Ela também trabalha com estudos articulando raça, gênero e mídia. O livro Adolescentes Negras, resultado de sua dissertação de mestrado, está à venda na livraria da editora em BH, mas é possível comprá-lo por email direto com a autora: carolliva@ig.com.br . E, acredite, vale muito a pena.Hoje, quando lavo meus cabelo crespos e os deixo livres, percebo ao meu redor diversos tipos de olhares, desde reprovação até de admiração ("Que coragem!"). Mas para que hoje, já na casa do 30, eu possa me sentir bem com essa imagem, que reforça que sou uma mulher negra, o caminho foi longo.
Lendo revistas femininas desde a pré adolescência, descobri que eu não estava adequada aos padrões estéticos da revista, nem da TV, nem de nada...

Foi nesse contexto que iniciei minha pesquisa de mestrado em educação. Considerando o poder “educativo” da mídia e que ela não se constitui do “nada” -- ela se alimenta do que a sociedade lhe fornece e aceita receber, num processo de alimentação cíclica --, considerei que podia “ler” como as relações raciais e o racismo estavam se apresentando no início do século XXI.
O racismo cordial que impera no Brasil nos dificulta e às vezes impede de percebê-lo, e nisso reside sua crueldade. Sem percebê-lo, não existe; sem existir, não o combatemos. Através da análise de revistas femininas em geral e especificamente as voltadas para as adolescentes, foi possível ver essa cordialidade.

As adolescentes negras aparecem pontualmente em episódios em que são convidadas a “corrigir” e “educar” seus corpos em nome, segundo a revista, não apenas da beleza, mas da "saúde". As revistas femininas são publicações baseadas no entretenimento e não na informação; a novidade é o que interessa, e não os acontecimentos atuais. Por isso seu discurso é o de ser algo ou alguém pelo consumo. Com a imagem da mulher negra não é diferente. Essa adolescente negra é convidada a manipular e modificar seu corpo. Ela é sempre alertada de que pode melhorar, mas sempre com muito trabalho. Trabalho expresso em expressões comumente associadas aos cabelos crespos e corpos negros: lidar, domar, rebeldes, indisciplinados.

Existem muitos exemplos em diversas edições da revista pesquisadas e de outras também, seja com a presença de mulheres negras, seja na sua ausência. Devemos ficar atentas para que esse discurso inclusivo emergente não nos seduza e deixe enganar, como se o racismo estivesse superado.

Durante minhas pesquisas percebi que para além da questão racial nos deparamos com a questão de gênero, uma vez que as publicações determinam padrões estéticos e de comportamento que as mulheres em geral deve seguir.O resultado dessa análise é meu livro Adolescentes Negras, no qual pretendo levar xs leitorxs a aguçar o olhar para os lugares determinados para mulheres negras na nossa sociedade. Assim, podemos começar a pensar em como mudar essas perspectivas.

POSTED BY LOLA ARONOVICH AT 10:32
LABELS: CABELO, GUEST POST, RACISMO